O vento frio cortava a pele, e o cheiro úmido da mata se misturava ao perfume suave de flores silvestres.
A floresta parecia respirar… viva, antiga, observadora.
Foi para lá que Ricardo decidiu levar Luísa, sua namorada, numa viagem que ele dizia ser “a mais especial da vida deles”.
Na verdade, ele queria pedir ela em casamento.
Mas Ricardo não era um homem fácil.
Era bruto, arrogante e se achava o dono do mundo.
Falava alto, ria debochando de tudo e acreditava que podia mandar até na natureza.
Eles estavam viajando pela Europa, e ele insistiu em acampar numa floresta famosa pelas lendas locais.
Um dos moradores chegou a avisar:
— “Senhor, aqui há ursos. E não são animais comuns… dizem que um deles é o protetor da floresta. Respeite o lugar.”
Mas Ricardo soltou uma risada alta e zombou:
— “Urso protetor? Isso é conversa pra assustar turista. Eu sou homem, nenhum bicho vai me botar medo.”
No dia seguinte, já no meio da mata, ele montou a barraca de qualquer jeito, abriu uma garrafa de bebida e começou a gritar palavrões, rindo alto.
Quando terminou de comer, jogou as embalagens no chão, pisoteou flores, chutou pedras, e ria.
Luísa, delicada e com o coração bondoso, tentava recolher o lixo com uma sacolinha.
— “Ricardo, não faz isso… a floresta é viva. A gente tem que respeitar.”
Mas ele só respondeu:
— “Ah, para com isso, mulher! Isso é mato, não tem ninguém vendo.”
Luísa, então, fechou os olhos e murmurou uma prece baixinha, pedindo desculpas à mãe natureza pelo que ele fazia.
Mais tarde, os dois foram até o rio.
Ricardo jogou pedra na água, gritou, e até derramou bebida dentro do rio, como se fosse uma brincadeira.
Mas a floresta, silenciosa, observava…
Os galhos começaram a ranger com o vento, e um pressentimento ruim tomou conta do ar.
Quando o sol começou a se pôr, Ricardo se aproximou de Luísa com um sorriso forçado.
Tirou uma caixinha do bolso e abriu — dentro, um anel.
— “Tá vendo? Eu sou romântico também. Quer casar comigo?”
Ela olhou para o anel, mas ficou sem reação.
O coração dela apertou — aquele não era o homem certo.
Era alguém que não respeitava nem a vida, nem o silêncio da natureza.
— “Obrigada, Ricardo… eu gosto de você, mas…”
Ela não conseguiu terminar.
Ele ficou furioso.
— “Mas o quê? Você vai recusar? Eu tô te pedindo em casamento, mulher!”
— “Não é isso, é que… não sei se esse é o momento…”
Ele jogou o anel no chão, chutou a fogueira e gritou palavras que ecoaram entre as árvores.
Naquela noite, a floresta ficou mais escura do que nunca.
O vento parou.
Nem grilos, nem corujas.
Somente o silêncio.
Luísa se encolheu dentro da barraca, rezando baixinho.
Ricardo saiu andando pela mata, ainda gritando, desafiando o mundo.
Foi quando ouviu o som…
Um estalo forte. Depois outro.
E então, o rugido.
Um urso enorme, de pelos escuros e olhos profundos, apareceu entre as árvores.
Mas havia algo diferente nele — uma presença antiga, quase espiritual.
Ricardo congelou.
O urso se ergueu nas patas traseiras e rugiu de novo, um som que fez as folhas vibrarem.
— “Sai daqui, bicho! Vai embora!” — gritou ele, tentando parecer corajoso.
Mas o urso apenas avançou, sem pressa, como se cumprisse uma sentença antiga.
Luísa ouviu o grito.
Um grito que se perdeu dentro da floresta… e depois, o silêncio total.
Na manhã seguinte, quando o sol nasceu, Luísa saiu correndo.
A barraca estava rasgada, o chão marcado de pegadas profundas… mas Ricardo tinha desaparecido.
Nem sinal dele.
Apenas o anel, deitado sobre uma pedra coberta de musgo.
Ela deixou o anel ali, se ajoelhou e murmurou:
— “Obrigada, guardião… por me deixar viver.”
Depois disso, Luísa foi embora e nunca mais voltou àquela floresta.
Dizem que, nas noites frias, se alguém jogar lixo ou insultar a mata naquele mesmo lugar,
ouve-se um rugido distante…
Um aviso do Urso Protetor, o guardião da natureza, que não permite que o desrespeito fique impune.



