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O Encontro dos Dentes Perdidos

“O Encontro dos Dentes Perdidos”

Ela estava animada. Depois de semanas deslizando para a direita no Tinder, finalmente encontrou alguém que parecia diferente. Gisela tinha fotos que transmitiam cuidado, beleza e charme. Cabelo sempre arrumado, maquiagem impecável, roupas elegantes. O perfil dela exalava cuidado pessoal e um certo “ar de perfeição”.

Durante as conversas, Gisela se mostrou divertida, comunicativa, alguém que fazia a outra rir mesmo pelas mensagens. As horas passavam sem que percebesse, cada “oi” e cada risada trocada pareciam construir uma conexão. Ela pensava: “Talvez dessa vez eu tenha encontrado alguém de verdade.”

Finalmente, marcaram o primeiro encontro. Mas havia uma peculiaridade: Gisela pediu para que ela a levasse ao dentista. Um pedido estranho para um primeiro encontro, mas nada impossível. Talvez fosse apenas uma forma de quebrar o gelo.

No dia marcado, ela chegou à casa de Gisela. Tudo parecia perfeito à primeira vista: cabelo arrumado, roupas cheirosas, perfume suave. Mas o momento do cumprimento trouxe o primeiro choque: Gisela se inclinou para um beijo, e o hálito invadiu o ar como um vento inesperado e horrível. Um cheiro intenso de algo podre, metálico, impossível de ignorar.

Ela tentou disfarçar. Baixou o rosto, engoliu em seco, respirou pela boca para escapar do odor, mas mesmo assim o cheiro parecia impregnar seu nariz. Tentou sorrir, mas o corpo reagia sozinho — um arrepio, um desconforto que ela não conseguia esconder.

Antes que pudesse reagir mais, Gisela disse:

— Preciso ir ao banheiro rapidinho.

Ela assentiu, pensando que tudo bem, mas alguns minutos depois Gisela voltou… sem se lavar. A cena foi quase cômica, se não fosse tão constrangedora.

— Você não vai se lavar? — perguntou, sem conseguir esconder a surpresa.

— Ah, é rapidinho, a gente já vai sair — respondeu Gisela, com um sorriso inocente, como se nada tivesse acontecido.

Ela insistiu. Finalmente, Gisela se dirigiu ao banheiro e saiu alguns minutos depois, dessa vez pelo menos com a higiene feita. Mas o desconforto já tinha se instalado. Cada sorriso, cada movimento, cada gesto parecia amplificado pelo episódio anterior.

Seguiram para o consultório odontológico. E foi lá que o choque final chegou. Gisela abriu a boca para o dentista, e a realidade surgiu como uma tempestade:

Dois dentes completamente irrecuperáveis, negros e deteriorados, que precisariam ser extraídos.

Quatorze dentes com cáries profundas, alguns quase se desmanchando ao toque, clamando por obturações urgentes.

Tártaro acumulado, duro e amarelado, cobrindo as superfícies dentais como uma muralha que parecia resistir a qualquer escova.

O dentista, profissional e calmo, não conseguiu esconder o leve espanto. Ela, sentada ao lado, segurava as mãos juntas, tentando não demonstrar choque, mas cada detalhe da boca de Gisela parecia gritar em sua mente. O perfume, o cabelo impecável, tudo de repente se chocava com aquela realidade crua e inesperada.

Durante a consulta, Gisela falava casualmente, como se fosse normal viver assim, como se dentes podres e tártaro fossem apenas “detalhes do dia a dia”. Ela, ao lado, tentava sorrir, mas era impossível. Cada detalhe do mau hálito que ainda restava, cada resíduo, cada som do raspador do dentista batendo nos dentes, fazia o estômago dela revirar.

Ela pensou: “Como alguém que se apresenta tão perfeita nas fotos pode ter uma boca tão destruída? Como o Tinder não alertou meu sistema de defesa interno?”

Enquanto o dentista explicava, Gisela continuava conversando, rindo de pequenos detalhes, completamente alheia ao desconforto que causava. E ela, ao lado, se sentia presa entre a educação e o horror: queria sair correndo, mas também não queria magoar alguém que parecia, na essência, só querer companhia.

No final da consulta, o dentista recomendou uma série de procedimentos: extrações, obturações, limpeza profunda. Gisela escutava distraidamente, como se fosse uma lista de compras. Ela, por sua vez, tentava não rir de nervoso, tentando transformar o constrangimento em história para contar depois.

Quando saíram do consultório, caminhando pelas ruas, havia uma mistura de emoções: humor, constrangimento, surpresa e um pouco de pena. Ela sabia que jamais esqueceria aquele encontro. Um simples “match” no Tinder se transformou em uma aventura de dentes podres, tártaro e choque de realidade.

No fim, aprendeu duas lições valiosas:

1. Nem tudo que parece perfeito nas fotos é perfeito na vida real.

2. Alguns encontros transformam-se em histórias que, embora constrangedoras, ficam para sempre na memória.

E assim, o primeiro encontro com Gisela virou um capítulo inesquecível em sua vida — um encontro que combinou charme, horror dental e lições inesperadas sobre expectativas, realidade e coragem para encarar situações improváveis.

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